O papel da agricultura familiar no cenário da produção de alimentos no Brasil é de suma importância. A atividade está diretamente relacionada às pequenas propriedades rurais, que geram renda para os membros familiares, fortalecimento da economia regional e abastecimento do mercado interno do Brasil com alimentos como verduras, frutas, legumes e laticínios. É o que aponta o engenheiro agrônomo e assessor técnico agropecuário da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Rural e Agricultura de Queimados, Walace Rodrigues.
“A agricultura familiar é responsável pelo abastecimento interno com o equivalente a 70% dos alimentos consumidos no país e gera algo superior a 80% no que tange a geração de empregos no campo. Ela contribui ainda para a preservação do ambiente e dos recursos naturais, uma vez que predomina a prática de manejo agrícola de base sustentável para a produção de alimentos.”
Segundo o último Censo Agrícola brasileiro, realizado em 2017, a agricultura familiar representa o maior contingente (77%) dos estabelecimentos agrícolas do país. Para ser considerada uma atividade de agricultura familiar, o produtor rural precisa ter uma propriedade de pequeno porte com até 4 módulos fiscais (unidade de medida cujo valor é fixado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) com atividades agrícolas e metade da força de trabalho composta por familiares. A atividade também precisa ser responsável por, pelo menos, 50% da renda da família. É o que define a Lei 11.326 regulamentada pelo Decreto 9.04/2017.
Porém, por serem territórios de pequeno porte, as produções da agricultura familiar ocupam o equivalente a 23% da área agrícola total em comparação aos grandes estabelecimentos ligados ao agronegócio, que não tem como foco o abastecimento alimentar do país e é responsável pela produção de produtos para exportação como soja, carne e milho, as chamadas commodities agrícolas.
“O agronegócio integra diversos setores econômicos e contribui para o abastecimento interno, porém, ele tem muito mais expressão na produção voltada para o abastecimento externo. Ele é o fomento industrial no fornecimento de subprodutos e matérias-primas”, explica Rodrigues.
Agronegócio x agricultura familiar
O setor do agronegócio brasileiro é representado no Congresso pela bancada ruralista, composta por políticos ligados ao setor. Neste cenário, a agricultura familiar fica em segundo plano no que diz respeito às pautas e avanços em prol do pequeno produtor.
Em meio à pandemia da COVID-19, o presidente Jair Bolsonaro vetou pontos do Projeto de Lei (PL) 735/2020 de medidas emergenciais de suporte para agricultores familiares ao mesmo tempo em lançou o Plano Safra 2020/2021, de incentivo aos grandes produtores.
No entanto, há boas políticas públicas atuantes no Brasil, como aponta o engenheiro agrônomo, que destaca o PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), o PNCF (Programa Nacional de Crédito Fundiário), o PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar), que assegura a compra mínima de 30% de alimentos da agricultura familiar para merenda escolar através de chamadas públicas, e o PAA (Programa de Aquisição de Alimentos).
Para ter acesso às políticas públicas de incentivo e geração de renda, o agricultor familiar precisa tirar a Declaração de Aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (DAP).
“Ainda temos muito o que avançar, estamos caminhando e o papel do extensor rural tem fundamental importância na identificação de entraves das políticas públicas e quais parâmetros são os fatores limitantes ao fortalecimento da agricultura familiar. Eu acho que muito ainda deve ser feito com relação à legalidade da terra e ao acesso às demais políticas de incentivo. As políticas de crédito rural também deveriam ser mais flexíveis para o acesso do agricultor”, destaca Rodrigues, que também atua como extensor rural, função composta por profissionais de diversas áreas que atuam junto aos pequenos produtores na promoção do desenvolvimento rural.
O agricultor Cláudio Dantas, de 42 anos, possui um sítio em Japeri, onde produz aipim e cria galinhas caipira e codornas. Ele vem recebendo apoio de Rodrigues neste processo de se estabelecer como produtor familiar.
No ramo há 5 anos, o pequeno produtor largou a cidade para se dedicar à agricultura familiar junto da esposa. As vendas são realizadas em feirinhas da cidade ou diretamente com comerciantes. Segundo ele, atuar na agricultura familiar é positivo, mas há ainda alguns entraves. “Acredito que poderia ter mais recurso pra gente, porque quando você vai correr atrás das coisas é um pouco complicado, por nós sermos pequenos, né”, finaliza o agricultor.